segunda-feira, abril 12

A PAIXÃO DE CRISTO

Para analisar A Paixão de Cristo (The Passion Of Christ, Mel GIbson, EUA, 2004) é preciso dividir a análise em duas partes: a ideológica e a técnica. Ideologicamente, o filme conta de maneira mais do que fiel a história mais popular da humanidade, a história que mudou o curso da vida humana. Todos nós, crentes ou não, já ouvimos a história do Cristo crucificado e todo o sofrimento que foi o seu sacrifício pela humanidade. Respeitando as convicções religiosas de cada um, é impossível não se emocionar com o fato de um homem se oferecer aos desígnios divinos, por piores que eles sejam, somente para poupar a humanidade. Não há como não concordar que Jesus Cristo, o homem, era sim um ser humano iluminado, que veio para mostrar ao mundo o que é o verdadeiro amor incondicional. Quanto às discussões polêmicas do filme, há sim anti-semitismo, todo ele praticamente resumido numa única frase dita por Jesus a Pôncio Pilatos. O problema é que vivemos hoje em um mundo onde justamente alguns que pregam o fim da intolerância a praticam, impedindo que todos os outros apontem suas culpas. Não se pode generalizar e culpar todos os judeus pela morte de Cristo, assim como não se pode culpar todos os alemães pela morte de milhares de pessoas na Segunda Guerra Mundial, assim como não se pode culpar todos os americanos pelos absurdos cometidos pelo seu presidente. Agora, não dá pra negar que foram os Sacerdotes judeus que prenderam e crucificaram Jesus, com o respaldo da maioria do povo. Todas as raças tem sangue nas mãos, isso faz parte da história humana. Cabe a nós TODOS assumirmos nossas culpas e nos arrependermos. Quanto ao excesso de violência, é hipocrisia dizer que Jesus não sofreu daquele jeito. As cenas são fortes sim, mas realistas e fazem parte do contexto, justamente por mostrar realisticamente todo o sacrifício e a provação pela qual passou o Cristo por nós.

Mas a grande sacada do filme foi mostrar essa história que, por si só já tem um enorme fundo místico, de uma forma crua, real e humana. Eu, particularmente, sempre achei que Jesus era um ser humano além da média, com qualidades incomparáveis, mas ainda assim um simples humano. Por mais que tenha sido criado em um ambiente católico e sendo uma pessoa espiritualizada, eu sempre achei que o Jesus mito era muito maior do que o Jesus humano, e sempre pensei que Jesus não foi crucificado por ser o "filho de Deus" e parte de um plano divino, mas sim por ser um líder popular que colocava o status quo da época em perigo. E o filme mostra exatamente isso. Em nenhum momento Jesus é mostrado como um milagreiro, um mágico, mas sim como um humano comum, que sente dor e cansaço e que tem imensas dúvidas internas sobre o seu papel no mundo, assim como todos nós. Além disso, em uma cena de Jesus com a sua mãe, o filme mostra um Jesus comum, que faz o seu trabalho e que brinca com sua família. Em resumo, ideologicamente falando, A Paixão de Cristo é sim um filme que merece ser visto por todos, sem exceção, sejam cristãos ou ateus. Até porque até o mais ateu crê no amor, e esse filme mostra o maior exemplo de amor de toda a história humana.

Tecnicamente falando como obra cinematográfica, o filme revela seus problemas. Mel Gibson deve ser admirado por todos por ter tido a coragem e o esforço de tocar adiante um projeto tão ousado e polêmico, mas o fato é que a sua atuação como diretor é fraca, beirando o amadorismo. Realmente existe um excesso no uso de slow motion, usado em algumas cenas para aumentar a dramaticidade, mas que tem como resultado justamente o contrário. Na cena em que Jesus é empurrado por um soldado romano e derruba pela primeira vez a cruz, se Gibson dispensasse o uso do slow motion, a cena teria muito mais impacto, por exemplo. Outro problema - que na verdade é um problema comum a todos os filmes que falam dessa história - é a má caracterização dos personagens. Claro que, por ser a história mais conhecida da humanidade, a maioria dos personagens já é conhecida por todos. Mas isso não é desculpa para não apresentar alguns personagens de uma forma mais didática, em vez de simplesmente jogá-los de repente no filme - por exemplo, eu não sei quem é o homem que ajuda Cristo a carregar a cruz, um personagem importante no contexto. A montagem do filme também é terrível, perdendo o ritmo em vários momentos, principalmente no fim, quando o filme fica arrastado justamente no seu clímax emocional. Em compensação, a atuação de Jim Caviezel é perfeita. O católico fervoroso Caviezel estabeleceu um paradigma como Jesus, na sua atuação extremamente bem dosada, perfeita em todos os momentos. Depois de ver esse filme, vai ser difícil pensar em Jesus Cristo sem ver o rosto de Caviezel.

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